O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, acompanhado de uma comitiva, desembarca no Recife nesta segunda-feira (16) para avaliar as condições do Complexo Prisional do Curado, considerado um dos piores do País. E, apesar da redução na superlotação, deve encontrar um cenário de favelização e falta de segurança.
A iniciativa, que faz parte do projeto “Caravana dos Direitos Humanos”, prevê uma vistoria nos três presídios que compõem o Complexo, além de reuniões com os profissionais das unidades, representantes da sociedade civil e do governo do Estado. A agenda segue até quarta-feira (18).
Integrante do Conselho da Comunidade da 3ª Vara de Execuções Penais da Capital e coordenadora do Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura, Wilma de Melo vê com grande expectativa a vinda do ministro ao Recife para discutir o sistema prisional. Ela, inclusive, deve apresentar uma lista de cobranças antigas que precisam ser adotadas pelo Estado para minimizar os problemas históricos nos presídios do Curado.
“Apesar de o Complexo não se encontrar mais com aquela superlotação, a estrutura dos presídios segue sucateada. Há problemas sanitários, ambientais, insalubridade. Há muitos barracos de alvenaria, barracos feitos em celas. A gente desconfia até que o número de vagas seja menor do que o Estado afirma. É preciso fazer essa recontagem. Além disso, faltam policiais penais para garantir a segurança de todos e, por causa disso, funções administrativas continuam sendo repassadas aos presos, conhecidos como chaveiros”, afirmou Wilma em entrevista à coluna Segurança.
A superlotação, de fato, deixou de ser o principal problema no Complexo do Curado. Isso graças à determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em agosto de 2022, para que 70% dos presos deixassem os três presídios, devido à falta de condições estruturais básicas e de segurança. A meta não foi atingida pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) no prazo estabelecidos de oito meses. Porém, em agosto deste ano, mais de 4 mil homens já haviam saído do Complexo (de 6.509 caiu para 2.463). A capacidade é de cerca de 1,8 mil detentos.
O resultado, a partir de mutirões para análise dos processos dos reeducandos, é uma demonstração de que, quando há vontade e empenho do Poder Público, é possível diminuir a superlotação, além de garantir os direitos básicos das pessoas privadas de liberdade.
Os mutirões contaram com juízes, promotores e defensores públicos.
DEFENSORIA PÚBLICA FOI AO STF COBRAR CONTAGEM DAS PENAS EM DOBRO
Por decisão do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), também foi determinada a aplicação do chamado “cômputo em dobro” das penas aos presos do Complexo. Desta forma, cada dia em que o detento permaneceu em um dos três presídios está sendo contada em dobro – reduzindo o tempo de permanência no regime fechado.
A determinação de Fachin, publicada em dezembro de 2022, levou em consideração uma antiga decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos que não estava sendo aplicada. Por isso, a Defensoria Pública do Estado precisou ingressar com uma ação para que a exigência fosse cumprida.
“Fomos ao Supremo após uma série de resistências do Estado em garantir os direitos das pessoas privadas de liberdade. Desde setembro de 2019, a Defensoria tenta a aplicação do cômputo em dobro, mas havia resistência do Poder Judiciário de cumprir o direito”, afirmou defensor público Michel Nakamura, em recente entrevista.
Mesmo assim, segundo Wilma Melo, “o Estado segue sem aplicar o computo em dobro”.
“A responsabilidade é de todos. Governo, Justiça, Ministério Público. Mas o que observo é que o Estado não cumpriu nem a resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos e nem a correição do CNJ. Além disso, é preciso deixar claro que houve a redução dos presos no Complexo, mas muitos foram transferidos para outras unidades prisionais que estão lotadas. E essas transferências foram feitas de forma desumana, sem que familiares tomassem conhecimento”, pontuou Wilma.
“FAVELIZAÇÃO” CHAMOU A ATENÇÃO DE MEMBROS DO CNJ
Na visita ao Complexo do Curado, em agosto de 2022, a então corregedora Nacional de Justiça, Maria Thereza de Assis Moura, junto a uma comitiva do CNJ, identificou um cenário de superlotação, precariedade e até “favelização”.
No Presídio Juiz Antônio Luiz Lins de Barros, por exemplo, foram encontrados problemas estruturais e falta de higiene por toda a parte. Sem quartos, detentos improvisaram buracos para dormir. Para ter acesso, eles têm que rastejar. Os presos também são forçados a dormir no chão por falta de celas, abrigados da chuva por pedaços de lona.
Relatório sobre o Complexo do Curado apontou ainda há um “mercado paralelo” nos três presídios. E que o problema histórico ocorre por causa do excesso de presos e da falta de controle do Estado para evitar que essas pessoas privadas de liberdade ditem as regras dos pavilhões.